terça-feira, 14 de abril de 2009

A comida mal teve tempo de passar. A vez era mesmo dos pensamentos, descendo embolados ladeira abaixo. Achando que eram os donos da casa, pediram o controle da televisão (e de quebra de todo o resto do sistema). Mal pude ter tempo de reivindicar. Quando vi já queriam meu dia, minha vontade, meus preciosos segundos de paz embaixo do chuveiro. Hóspedes mais insolentes. Eu atrás do silêncio e eles com a sinfonia de idéias. Me mudei. Troquei de casa por um tempo, escondi o endereço. De vez em quando é preciso tirar férias de mim. Se algum deles bater na sua porta, com sorriso na cara, por favor não comente nada. E se gentilmente abrir, lembre: eles podem não mais querer sair.

Preso

Um alfinete alavancado na alma. Um toco bem no meio da garganta. Era minha sensação todo o tempo, num ata-nem-desata. Vontade de parar tudo e descer. Parece que de um dia para o outro você começa a viver errado, por mais intransitivo que seja o verbo. Dá uma agonia de alma, uma espinha no coração (Só que tossindo já vi que não sai). Vou andando meio invocada, chutando lata nos pensamentos. Naquela parada em que você não é sim, nem não. Nada fala do lado de fora, nada explica do lado de dentro. Noite. Aqui também.

Caros Leitores,

Perdoem uma eventual falta de constância, uma briga com o sisudo calendário (nunca fui mesmo muito boa em rotinas). Perdoem a indelicadeza de não lhes trazer toda segunda-terça-quarta-tod0-nome-de-feira um texto novinho, com cara de gente, tão cheio de tanto pra dizer. É que para sentir, não pode haver pressa. Não há lugar. Assim como não se adianta a chegada dos amores, nem se anoitece ao meio-dia, nem se antecipa a saída de um rebento, nem se pede ao outono que acabe logo, nem se socorre alguém são, nem se manda em um batimento cardíaco, nem se estica as pernas de um menino, nem se adivinha as sortes ou infortúnios de um tempo, não há como se viver um texto antes da hora. Porque a matéria do texto é a própria vida. É disso que ele se alimenta, e aceita, convalescido, o seu ritmo. O texto tem sua própria natureza e desabrocha no seu dia, quando já guardou chuvas demais. Resta a nós a paciência que a vida nos pede, quando andamos em linhas, quando escrevemos o destino e nem percebemos. Pra quem vive de alma aberta, não há tempo. Pra quem nasce texto, também não.