domingo, 3 de maio de 2009

Descalços.



Sabem-se feios. E é só. (Uma daquelas coisas que nos contam). Em todo o resto do tempo, têm em si uma singeleza e uma vontade de viver tão grande que não podem se ocupar de mais nada. E são tão admiráveis. Sempre tiveram muito mais coragem do que eu, e em sua estranheza tocaram firmes a beleza do mundo. Sempre os vi assim: sedentos de sentir. A frieza da chuva, a maciez da grama, a dureza do chão, o morno da pele, a noite condensada na rocha, o vento, o espalhado de água. Vez ou outra sorriem mergulhados em areia branca - só eu percebo. Sempre quiseram andar assim, sem nenhuma veste, nus e arredios a vida inteira. Quanto os invejo. Porque se têm uma capa grossa é porque escolheram desde cedo enfrentar o gosto da terra, fizesse cócegas ou fervuras. A capa foi só uma proteção que a vida lhes deu, porque decidiram nunca tê-la para com a vida. Que inveja sinto dos meus pés. E quanto amor há em seu aspecto distraído, como uma criança despreocupada. Tão cheios de talhos, por vezes secos como o chão, mas de tanta poesia. Amo-os com paixão e deixo que sejam com liberdade. Mas apesar de tanto querer e tanto desembaraço em viver, há muito não recebem carinho. Esquivam-se. Tudo porque é o único momento em que lembram-se feios. E é só. De todo o resto se perdem em sua beleza infinita misturados às texturas da natureza. E doam-se, ao mesmo tempo em que se encarregam de sentir o mundo pra mim.

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