
já não amo,
mas penso.
Se amo sem perceber,
então amo
por um desaviso de dias
por uma inocência de anos
e caminho leve,
embora tão cheia de sentimentos.
passeando no jardim de mim.
Filho já nasce gente. Por mais difícil que seja acreditar. Persistente, preocupado, vezes silencioso por natureza, calmo sem remédio, como se já conhecesse a vida, mesmo que tenha acabado de chegar. Mal olha você nos olhos e já emite uma opinião, estalada e certeira, derrubando por terra a sua ilusão de poder escolher o mundo para ele. Filho nasce com sua sabedoria, seu mecanismo original e indecifrável de lidar com o mundo, atravessando, sobrevivendo, acalentando com a ponta dos pés ou transformando. Ao passo que se ensina, se aprende tanto. De onde surgem o magma dos filhos? Quem os fez como são, com sua graça, sua poesia escapando entre as janelas dos dentes? Tanto de gente em tão pouco corpo. Tanta vida em tão delicadas expressões. Tanto amor em tão pequenos olhos. E de onde nascem as mães? Filho já nasce gente, se percebe, mas mãe não nasce mãe. De onde tiram o sim, eterno e teimoso, que enfrenta o peito robusto dos anos, tão forte quanto o próprio amor? De onde inventaram essa mania de estar sempre presente, uma fidelidade voluntária, um compromisso que as faz renunciar, muitas vezes, a quem são. O que as prende? Com que tanta delicadeza passam a vida, voltando os olhos para nós, com a cabeça inclinada em nossa direção, ainda que frágeis? Amor que não se explica, mas que se dilata na alma, ocupando um espaço sem tamanho. Que marca o tempo, que se faz presente, que se faz tão presente, mesmo que ausente – é só fechar os olhos.
Para Minha Mãe, Meu Amor. E para minha Vó Clélia, que emprestou tanta ternura para compor minha alma e que me deixou uma grande saudade.
Nunca há um tanto de espaço para nós. Nossos olhares imediatamente mudam de calçada (ainda que estejam no mesmo vão). Atravessam. Começamos o texto sempre sem saber as primeiras palavras. Nossos encontros são tão desajeitados, que pairam entre a comédia e o suspense - um susto e os dois saem correndo. Eu sei, eu te desconserto – como se você já não fosse torto o bastante. Você me agonia - como se eu nunca me perdesse na rota. Tenho a sensação de que estamos fazendo cócegas numa hora tensa, num absurdo de hora. Nossos risos surgem tão de repente, que parecem ser uma chegada e ao mesmo tempo uma despedida. Há mesmo que se correr. Há que se voar. Há que ser muito breve para que não escapem, por um segundo, todas as intenções.
Mulher tem mania de amar incondicionalmente. Sim pelo sim, não pelo não. Mulher não pergunta para gostar. Não entende para querer. Não espera para ir atrás. Mulher abraça a vontade que nem é sua. Mulher apara seu choro com beijo, quando não impede você de chorar. Mulher sonha com seu sonho. Ri com sua risada, mesmo que não tenha assim tanta graça para ela. E apesar do homem ser o tal do protetor, é a mulher que cuida, que guarda, que se debruça sobre sua vida como ninguém. Mulher nasce sabendo amar. Não que isso faça ela deixar de ser quem é. Mas é que ser mulher é irremediavelmente ser amor.